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De próprio punho
A escrita e suas tecnologias sofrem interessantes metamorfoses, numa ciranda
que vai do simples bilhete aos originais de um livro
Estranhei muito na primeira vez que escutei a expressão “de próprio punho”. Parecia que eu ia bater em alguém. Não era bem o caso. Foi numa situação bancária, dessas bem burocráticas, e eu devia escrever algo bem breve, mas com minhas mãos. Na verdade, o que importava era a autenticidade da minha caligrafia, que à época ainda era mais fluente e firme. Depois dos teclados de computador, ela rateia bastante. Minha letra, hoje, tem uma espécie de alternância: dia sim, dia não, trêmula e firme, forte e fraca, mais rotunda e mais cheia de arestas.
É claro que já escrevi muito mais de próprio punho ou, numa palavra mais bonita, manuscrevi (prefiro a mão ao punho, embora ele também seja usado na tarefa). Mas isso não é um feito individual. Em larga medida, é social. Muita gente sente o mesmo que eu, isto é, escreve bem menos usando as mãos, ou melhor, empregando algum tipo de tecnologia (lápis, caneta etc.) para escrever com grafite ou tinta ou giz ou carvão ou sangue e o que mais. É importante lembrar que ainda há gente que não sabe escrever neste país, neste planeta, mas muita gente sabe e tem um combo de tecnologias mais ou menos à disposição para isso. Sou dessas pessoas privilegiadas que têm várias possibilidades, e uma delas nunca deixou de ser o uso das minhas mãos. Ainda hoje, são elas que batucam meu teclado de computador ou que tocam suavemente duas ou três telas sensíveis. Mas não expressam mais a minha letra. No lugar, aparecem Times New Roman, Arial, Calibri e mais uma centena de “letras” à minha escolha. Eu e Deus e o mundo.
A despeito desse rol de chances e ferramentas para escrever, o manuscrito nunca deixou de pintar aqui e ali, muitas vezes como obrigação. Na escola, por exemplo, até hoje ele é soberano. No Enem também. Curioso, não? Fico pensando em que espaços e ocasiões ainda uso minha letra. Olhando ao redor, na minha casa, minha letra está em espaços muito delimitados e específicos: bilhetes. Eles estão principalmente na cozinha, em especial na porta da geladeira, a fim de manter a comunicação com meus coabitantes, sempre muito esquecidos ou relapsos. Mas também há bilhetes em post its na minha mesa do escritório, textinhos em garranchos por meio dos quais me comunico comigo mesma, a evitar um comportamento esquecido e relapso.
No escritório, costumo ser mais suave comigo mesma, mas também muito mais lacônica, a ponto de nem eu me entender, se passar o tempo. Em todos os casos vai minha letra, menos e mais redonda, a lápis e a tinta azul, em post its rosa-choque, colados precariamente, e todos com destino à lixeira, em breve. Justo porque eles funcionam como lembretes de tarefas e coisas que devem ser vencidas e, claro, substituídas por outras, num fluxo infinito, às vezes ansiogênico, com que a maioria dos adultos (e mais ainda as adultas) precisa conviver.
As formas de escrever mudam, as necessidades também, e o resultado é um elenco complexo, em que nada dispensa nada, a depender da tarefa ou da importância das coisas ou de suas funções, claro. A escrita e suas tecnologias incríveis vão se reposicionando, mudando de status, numa ciranda interessante e importante que pode ser vista à luz de certa diversidade que encontra suas oportunidades e seus efeitos, aqui e ali. Não adianta muito pensar sempre como se tudo fosse excludente. Estão aí minha farta comunicação por bilhetes, minha gaveta alegre de post its de toda cor, esperando para serem usados, e o cheque do cartório, em que quase tudo já é digital. “Do punho ao pixel” não é uma frase filosoficamente correta. O negócio é mais “o punho e o pixel”.
Nesse texto, o que caracteriza a escrita “de próprio punho” é a letra manuscrita, enquanto a escrita digital é ilustrada pelo(a)
A) utilização de tecnologias diversificadas.
B) desenvolvimento de novos recursos de escrita.
C) possibilidade de interações mediadas por telas.
D) diversidade de fontes tipográficas que estão disponíveis.
E) delimitação dos espaços onde a produção textual ocorre.
São 1200 questões de 2009 a 2025, de todas as aplicações, arrumadas por assuntos e habilidades e ainda com percentual de acertos na prova ou nível de dificuldade.
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