O ensino e a prática médica brasileiros sofrem inúmeras limitações, entre as quais se destaca a deficiente formação científica. Ultimamente, surgiu a figura do médico-pesquisador como elemento capaz de suprir, em parte, tal deficiência.
     A criação desordenada de escolas médicas, nos últimos anos, é causa de imensa preocupação entre os profissionais dedicados ao ensino médico. Evidentemente, pode-se esperar que grande número de médicos pouco qualificados passe a exercer a profissão nos próximos anos. Para complicar, o número de hospitais de ensino é notoriamente insuficiente. Além disso, os hospitais de ensino, em geral, não possuem estruturas para treinamento em pesquisa. Isso representa uma ameaça ao atendimento médico da população em geral. É nesse contexto que se insere o médico-pesquisador, tanto de formação em ciência básica quanto de formação em clínica.
     Para começar, a formação do pesquisador requer uma formulação especial. Ele precisa entender de metodologia científica lato sensu. Especificamente, é necessário compreender a importância dos modelos experimentais, sejam de bancada, de experimentação animal, sejam clínicos. Registros baseados em prontuários médicos eletrônicos, com grande número de pacientes, são hoje amplamente utilizados como complementação aos estudos randomizados e representam o chamado “mundo real”. Assim, precisa entender princípios básicos de estatística, que hoje se tornou uma disciplina por si só, passando a ser indispensável. Também é imprescindível compreender bem a questão de vieses diversos, como os de seleção de amostras e a presença de fatores de confusão, sobretudo em estudos observacionais. É obrigatório o entendimento da adequação das amostras e modelos para a resposta de perguntas específicas.
     Diferentemente do que se observa na prática clínica, os resultados de pesquisas são, em geral, de longo prazo, podendo consumir anos ou até a vida inteira do investigador. Em resumo, a formação do pesquisador é um aprendizado em serviço, que envolve muitas disciplinas e cuja finalidade precípua é a busca da verdade e a criação de novos conhecimentos.
     A relevância do médico-pesquisador fica clara dentro do escopo de associar clínica e pesquisa. Trata-se de alguém que tem visão conjunta, integrada dos grandes problemas médicos. Isso tem a ver com eficiência, relevância, inovação e a noção de custo/benefício. Especificamente, cabe a ele analisar criticamente os resultados de pesquisas sejam experimentais, sejam aplicados, com o objetivo de verificar se os procedimentos empregados são de alta qualidade e, portanto, confiáveis. Exemplos recentes de publicações sem base científica sólida são os múltiplos estudos relativos ao tratamento medicamentoso da Covid-19; várias propostas terapêuticas se revelaram totalmente inócuas ou até prejudiciais, causando sérios transtornos no tratamento dessa pandemia.
     As funções do médico-pesquisador são essenciais na medicina translacional, compreendendo desde a divulgação de achados básicos, passando pela elucidação de mecanismos fisiopatológicos e síndromes clínicas e sobretudo encurtando o período entre descobertas de ciências básicas e sua aplicação clínica. Portanto sua atuação é essencial para o exercício qualificado da profissão médica, bem como para o desenvolvimento científico do país.

MÉDICO-PESQUISADOR, Prática Médica e Pesquisa: A Importância do Médico-Pesquisador na Medicina Atual. Disponível em: <https://www.scielo. br/>. Acesso em: maio de 2024. Adaptado.